O desempenho sexual masculino


O desempenho sexual masculino

Uma reflexão de…
Pedro A. Vendeira

 

 

Percursos…
Médico Especialista em Urologia, Responsável do Núcleo de Urologia da Saúde Atlântica – Clínica do Dragão (no Porto), membro da Direção da SPSC e Presidente da Sociedade Portuguesa de Andrologia, Medicina Sexual e Reprodução.

 

Data
5 de agosto de 2017

A sexualidade constitui um importante instinto e valor do bem-estar do ser humano. Cada vez se fala mais (e por vezes se hipervaloriza) a questão do desempenho sexual masculino – o homem é uma máquina. Falhar não é uma opção. Isso é que era bom. Os homens são acometidos de disfunções sexuais tais como as mulheres (onde até são mais frequentes). O facto é que no homem as alterações do desempenho ligadas a disfunções sexuais vão irremediavelmente alterar a sua qualidade de vida e autoestima, interferindo em diversos patamares da sua vida, ultrapassando rapidamente o quarto onde tudo acontece (ou não)… Uma vivência perturbadora.
Apesar de ser a ejaculação prematura a disfunção sexual mais frequente no homem, a verdade é que o verdadeiro grande fantasma é a disfunção erétil. Também, cada vez mais frequente, assistimos a queixas progressivas no que respeita à diminuição do desejo sexual. Este é uma novidade para os homens que lentamente se começam a habituar a que “a dor de cabeça” não é exclusiva do sexo feminino. De facto, com o ritmo de vida alucinante, as diversas fontes de stress, e sem esquecer o envelhecimento associado a uma esperança de vida cada vez maior, não seria de esperar outra coisa no que diz respeito às quebras de líbido. Não esquecer também que não existindo uma verdadeira andropausa no homem, a verdade é que também o declínio das hormonas sexuais com a idade carece de exclusividade…
No entanto, na esmagadora maioria das situações, aos nossos consultórios recorrem na maior parte das vezes homens e/ou casais cuja principal preocupação é a disfunção erétil.
A disfunção sexual, mais concretamente a disfunção erétil, definida como uma incapacidade para atingir a ereção adequada para um ato sexual satisfatório, é bem mais frequente do que à primeira vista se pensa ou se ouve. Para além de uma condição médica bem definida, está diretamente relacionada com a idade e com outras condições médicas relevantes, nomeadamente com a diabetes mellitus e as doenças cardiovasculares em geral. De facto, a disfunção erétil é muitas vezes a primeira manifestação destas doenças, contribuindo desta forma para um diagnóstico precoce das mesmas. Afetando de forma variável cerca de 50% dos homens com idades compreendidas entre os 40 e 70 anos, a disfunção erétil pode ser tratada com alto grau de sucesso, dispondo para tal de um vasto leque de tratamentos orais, locais e cirúrgicos. Desta forma, não há necessidade de constrangimentos, e seguir rigorosamente a orientação médica é fundamental para atingir bons resultados terapêuticos. Lentamente vamos assistindo à desmistificação da doença, não esquecendo que ainda existem muitos tabus, orgulhos e preconceitos, que atrasam a ida do homem (e do casal) a lugares especializados para obter tratamento para as suas disfunções.
É uma doença que afeta em Portugal cerca de meio milhão de homens, independentemente da sua gravidade (ligeira, moderada ou severa). Estes valores correspondem a cerca de 13% de homens com problemas de ereção, subindo para quase 24% se alargarmos a homens que tenham pelo menos uma disfunção sexual (libido, ereção, ejaculação ou orgasmo). É reconhecidamente um problema generalizado de saúde pública, que pode ter um impacto importante na qualidade de vida e relacionamento das pessoas afetadas. Este impacto na qualidade de vida do casal pode ser enorme, constituindo uma doença real, com repercussões a nível pessoal, social e profissional.

Lentamente vamos assistindo à desmistificação da doença, não esquecendo que ainda existem muitos tabus, orgulhos e preconceitos, que atrasam a ida do homem (e do casal) a lugares especializados para obter tratamento

Um estudo recente, efetuado em 13 países à escala mundial, mostra os portugueses no topo no que diz respeito a uma vida sexual mais ativa e espontânea. De facto, mais de metade dos portugueses têm relações sexuais pelo menos duas vezes por semana, enquanto 1,4 é a média mundial. Já países como a Dinamarca e a Coreia do Sul ocupam os últimos lugares com uma ocorrência por semana. Desenganem-se os que acham que tudo vai bem em terra lusitana… no extremo oposto, Portugal lidera no dado mais preocupante – o facto de os portugueses não recorrerem a ajuda especializada. Quando “algo corre mal no quarto” só 12% consultam um médico…
Não podemos também esquecer que devido ao crescimento global da população mundial, associado ao aumento da esperança média de vida, a sua prevalência vai crescer de uma forma altamente progressiva, estimando-se que em 2025 o número de doentes com disfunção erétil rondará os 322 milhões (cerca de 152 milhões em 1995). A “vergonha” injustificada de tal doença, aliada à falta de consciência ou de conhecimento da disfunção erétil como um problema clínico, e das opções terapêuticas disponíveis, levam os homens à real convicção que não existe tratamento eficaz. Faz parte da idade, dizem…
Numa perspetiva clínica, existem alguns fatores de risco relacionados com a disfunção erétil, nomeadamente a idade, doenças cardiovasculares, hipercolesterolemia, diabetes, efeitos laterais de medicações, sedentarismo, tabaco, fatores psicológicos, traumatismos e cirurgias pélvicas, alterações neurológicas e hormonais, entre outros. Previamente à instituição de uma terapêutica oral, tratamento atual de primeira linha, dada a sua extrema eficácia e alta segurança, é importante tentar controlar e alterar estes fatores de risco (pelo menos aqueles passíveis de ser alterados). Mudanças de fatores relacionados com o estilo de vida, nomeadamente o tabagismo, ingestão excessiva de álcool e toxicodependência, bem como interferir nos fatores psicossociais (onde os princípios mais importantes são combater a desinformação sexual, promover a resolução de conflitos conjugais e prevenir os quadros depressivos) são formas de abordagem altamente eficazes para uma correta avaliação e tratamento da disfunção erétil.
A abordagem deste tema perante o médico toma diversas formas. Por vezes, a consulta é “encapotada”, isto é, a queixa diz respeito a outra situação (habitualmente são queixas relacionadas à próstata e respetivos sintomas urinários), e mais para o fim da consulta o homem timidamente diz: “e já agora” – e é nesta fase que nos apercebemos nitidamente do verdadeiro motivo da consulta. Um outro grupo de homens prefere garantidamente que seja o médico a abordar o problema (“a quebrar o gelo”), permitindo um diálogo que já diminui muito o stress destes pacientes (“ao fim e ao cabo foi o médico quem perguntou, pensam”). Muitos doentes necessitam de mais de uma consulta para criarem o ambiente informal com o médico de forma a poderem expor o que os preocupa já com um menor grau de constrangimento.
Agora – ATENÇÃO – muitas vezes o doente desconhece ser portador de algumas doenças e o diagnóstico das mesmas pode ser feito a partir da disfunção erétil, que pode até ser o sintoma inicial. Estudos científicos comprovam que homens com disfunção erétil têm maior risco de apresentar concomitantemente obstrução das artérias coronárias e portanto maior risco de enfarte agudo do miocárdio. Assim, é de fundamental importância que os homens com disfunção erétil procurem ajuda médica especializada e nunca façam uso de automedicação, pois desta forma podem estar a perder uma oportunidade de ouro de realizar o diagnóstico precoce de outras doenças potencialmente fatais e que têm melhor tratamento e evolução, quando identificadas cedo – assim a vergonha e os tabus do macho latino podem sair muito caros…

Por vezes, a consulta é “encapotada”, isto é, a queixa diz respeito a outra situação (habitualmente são queixas relacionadas à próstata e respetivos sintomas urinários), e mais para o fim da consulta o homem timidamente diz: “e já agora” – e é nesta fase que nos apercebemos nitidamente do verdadeiro motivo da consulta

A idade e a vivência da sexualidade podem ser fatores altamente motivadores ou, pelo contrário, profundamente castradores no que diz respeito ao readquirir da função erétil do homem. Situações em que a mulher encara com bons olhos o cessar da atividade sexual, pondo fim a um “dever” de longa data que na esmagadora maioria das vezes nunca lhe transmitiu prazer, pode ser vista como um fenómeno de “libertação” e como tal vamos observar uma passividade por parte desta companheira, aceitando naturalmente a situação e orientando o homem para outras motivações. Já o reverso da medalha é também verdadeiro, e fruto de uma nova era de tratamento da disfunção erétil, de outros casais com outras sexualidades que procuram ajuda. Para casais mais ativos a companheira sente curiosidade, apesar de em geral ser o homem a dar o primeiro passo. Isto não é sinónimo de que a mulher não quer tomar a iniciativa, mas pensa que o companheiro deve dar o primeiro passo. É de salientar, no entanto, que a passividade da mulher tem vindo a ser progressivamente substituída por atitudes globalmente mais participativas neste campo. Para casais mais jovens, a situação hoje está mais facilitada, pela abertura sexual atual. Desde que ambos se “entendam” sexualmente, os atuais meios de informação permitem maior liberdade de escolha, e se o homem ainda se sente envergonhado pela situação, hoje em dia é a companheira quem puxa dos galões e encara o problema como qualquer outra doença que surge e tem de ser tratada. É mais eficaz tratar estas dificuldades em casal, dado que desta maneira é francamente mais fácil determinar e contextualizar o tipo e origem das queixas sexuais. No fundo, um problema sexual é sempre um problema de casal.
A disfunção erétil é atualmente considerada uma entidade patológica bem definida e com múltiplas opções terapêuticas. Deve ser salientado que todos os doentes são diferentes, e que estes e as respetivas parceiras deverão avaliar a taxa de sucesso de qualquer terapêutica atendendo à sua eficácia e tolerância, bem como decidir se continuam ou não a terapêutica e a frequência de utilização da mesma. Os doentes deverão exercer a sua própria escolha, mas sempre com aconselhamento médico.
Há de facto mudanças na atitude da sociedade para com a Disfunção Erétil nos últimos anos, e que encontram o seu maior expoente no lançamento do Viagra® em 1998. As mudanças na sexualidade nos últimos 15 anos foram enormes, incluindo a possibilidade de criar novas armas terapêuticas, mas também na difusão dos conceitos e no conhecimento esclarecido de que existem tratamentos adequados para as diversas situações, devendo os doentes ser encorajados a procurar auxílio médico especializado, não permitindo que a situação se arraste para um ponto de não retorno transtornando de uma forma altamente significativa a estabilidade do casal. É uma realidade, que nunca se assistiu a tanta liberdade de expressão e consentimento, como no momento atual.
A terapêutica farmacológica oral da disfunção erétil começa hoje a ser amplamente utilizada, está altamente difundida e constitui a terapêutica de 1ª linha para a maioria dos doentes com disfunção erétil. De uma forma geral, as principais vantagens dos agentes orais são a sua boa tolerância, exibindo percentagens pouco significativas de efeitos laterais, a sua boa aceitação por parte dos doentes, dado o seu comportamento mais “natural”, quando comparado a outros tipos de tratamento, a sua facilidade de administração e, claro, a sua eficácia altamente comprovada em múltiplas causas de disfunção erétil, bem como as contraindicações mínimas que apresentam. Os agentes mais eficazes e seguros neste grupo são os inibidores da 5-fosfodiesterase (sildenafil (Viagra®), tadalafil (Cialis®), vardenafil (Levitra®), e avanafil (Spedra®), exercendo o seu efeito no mecanismo periférico da ereção, amplificando o efeito da estimulação sexual.
As terapêuticas locais podem dividir-se em intracavernosa, intrauretral, tópica e a utilização de dispositivos de vácuo. Constituem a 2ª linha terapêutica e as suas indicações são basicamente a ineficácia da terapêutica oral, contraindicações para fármacos orais específicos, efeitos adversos provocados pelos fármacos orais e preferências individuais. A terapêutica intracavernosa consiste na administração de drogas vasoativas por injeção peniana. Esta opção terapêutica tem como vantagens uma alta eficácia e segurança, assim como um rápido início de ação (5 a 10 minutos), devendo durar entre 1 a 2 horas. A autoinjeção após treino adequado do doente, é a forma habitual de utilização desta modalidade.
Já as terapêuticas cirúrgicas incluem a cirurgia vascular e a colocação de próteses penianas. No primeiro caso, incluem-se intervenções cirúrgicas altamente diferenciadas, com indicações muito precisas no tratamento da disfunção erétil. O seu intuito é aumentar o fluxo arterial e diminuir o retorno venoso. As suas indicações estão basicamente restritas a indivíduos jovens, com disfunção erétil primária, traumática ou iatrogénica. As próteses penianas representam o último recurso terapêutico na disfunção erétil, são altamente invasivas e irreversíveis. Apresentam, no entanto, o mais elevado grau de sucesso e satisfação pessoal entre todos os tratamentos disponíveis. As próteses penianas hidráulicas são funcionalmente superiores às restantes.