Abstraindo #1 – Disfunções sexuais e Sexologia


Abstraindo #1 – Disfunções sexuais e Sexologia

Abstraindo é uma rubrica nova no site da SPSC. Apresenta de forma resumida a investigação em sexologia que se faz em Portugal.

Violeta Alarcão é doutorada em Sociologia (ISCTE-IUL 2016), investigadora do Instituto de Medicina Preventiva e Saúde Pública (IMP&SP) da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa (FMUL), investigadora no Instituto de Saúde Ambiental (ISAMB) da FFMUL e do CIES-IUL.

Investigadora Principal do projeto FEMINA (2018-2021) – Fecundidade, Imigração e Aculturação: Abordagem Interseccional das Experiências e Expectativas de Saúde Sexual e Reprodutiva em Famílias Cabo-Verdianas e Portuguesas (Fundação para a Ciência e Tecnologia).

Referências

Alarcão V, Beato A, Almeida MJ, Machado FL, Giami A. (2016) Sexology in Portugal: Narratives by Portuguese sexologists, The Journal of Sex Research; 53(9): 1179-1192.

Alarcão V, Machado FL, Giami A. (2016) Traditions and contradictions of sexual function definitions for Portuguese heterosexual men and women: medicalization and socially constructed gender effects. Sexual and Relationship Therapy; 31(3): 271-288.

Alarcão V, Roxo L, Virgolino A, Machado FL. (2015) The intimate world of men’s sexual problems: Portuguese men’s and women’s narratives explicated through a mixed methods approach. Sexuality & Culture, 19:543–560.

Alarcão V, Virgolino A, Roxo L, Machado FL, Giami A. (2015) Exploring Gender in Portuguese Bedrooms: Men’s and Women’s Narratives of their Sexuality through a Mixed Methods Approach. Sociological Research Online, 20(2), 8.

O objeto central da investigação de doutoramento, que desenvolvi no Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa-Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL) e defendi em Janeiro de 2016, foi procurar compreender qual o significado e as experiências subjetivas da sexualidade, no geral, e dos problemas sexuais, em particular, especificamente o caso da disfunção erétil, como paradigma para entender as negociações das definições de masculinidade como resposta às necessidades sociais, constrangimentos físicos e recursos médicos.

A tese delineou-se no sentido dar resposta a dois objetivos centrais: compreender e interpretar sociologicamente os sentimentos de perda de função sexual, destacando-se o enfoque na esfera do social; e colmatar a escassez de informação acerca do campo da sexologia em Portugal, tanto enquanto ciência como profissão.

Globalmente, os resultados da tese, que integra dois estudos com metodologias mistas, foram apresentados sob a forma de quatro publicações científicas.

O primeiro artigo (Alarcão, Machado, & Giami, 2015) visou contribuir para a discussão acerca da forma como as crenças relativas à sexualidade e género condicionam a categorização da função sexual em natural ou patológica. Através de uma abordagem centrada na sociologia do diagnóstico e recorrendo à análise de entrevistas qualitativas, discute-se a realidade do sofrimento, a legitimidade do diagnóstico e da intervenção terapêutica e o papel das doenças na construção da rutura e da rutura na construção da doença.

O segundo artigo (Alarcão, Virgolino, Roxo, Machado, & Giami, 2015) forneceu um olhar sobre as dinâmicas de mudança dos comportamentos sexuais, apresentando um “modelo da sexualidade humana” composto por quatro tipos: rígido conservador, tradicional atenuado, progressivo adaptativo, e confluente transformativo. Procurou-se, nos discursos dos entrevistados, permanências e mudanças que ajudassem a compreender o processo de modernização e adaptação, num contexto em que se constroem relações íntimas e sociais mais modernizadas, características de um novo tempo social.

O terceiro artigo (Alarcão, Roxo, Virgolino, & Machado, 2015) visou explorar como é que a crescente pluralidade de scripts sexuais afeta a ordem de género, através dos sentidos que se tecem a partir das experiências pessoais no quotidiano, com enfoque nas representações sobre os problemas sexuais. Explorou-se como é que os homens vivem a perda da função sexual, que modificações são introduzidas nas relações sexuais, nas suas vivências da masculinidade e da sexualidade, que estratégias e recursos são mobilizados. Procurou-se também estudar os constrangimentos que produzem o corpo sexuado masculino e quais os significados que produzem para o género e a sexualidade.

Por fim, o quarto artigo (Alarcão, Beato, Almeida, Machado, & Giami, 2015) analisou como é que os sexólogos portugueses integram o seu papel profissional no vasto campo multidisciplinar da saúde sexual, fornecendo uma visão global da emergência da sexologia enquanto scientia sexualis em Portugal. A informação empírica resulta essencialmente da exploração de material recolhido através de entrevistas aprofundadas junto de um grande número de peritos de sexologia, nomeadamente sobre as suas perceções do sentido da sexologia como profissão.

Em suma, a pesquisa teve um objeto que se desdobrou em duas vertentes, a dos atores sociais e a dos campos, trabalhadas ambas sob a perspetiva da medicalização e moralização da sexualidade, visando contribuir para o desenvolvimento da investigação sociológica da sexualidade em Portugal, particularmente no que diz respeito à intimidade e individualização das trajetórias sexuais, e à “medicalização da sexualidade” e “construção medicalizada da sexualidade”.