Abstraindo #2 – Perspetivas de portuguesas/es com incapacidades físicas sobre a sua saúde sexual


Abstraindo #2 – Perspetivas de portuguesas/es com incapacidades físicas sobre a sua saúde sexual

Abstraindo é uma rubrica que apresenta de forma resumida a investigação em sexologia que se faz em Portugal.

Raquel Pereira é Psicóloga Clínica e Investigadora do Grupo de Investigação em Sexualidade Humana (SexLab) do Centro de Psicologia da Universidade do Porto. Em 2015, ganhou uma bolsa da Fundação para a Ciência e Tecnologia (SFRH/BD/112168/2015) e iniciou o doutoramento na temática da sexualidade e incapacidade física, sob orientação do Prof. Doutor Pedro Teixeira (Universidade do Minho) e do Prof. Doutor Pedro Nobre. Em 2014, concluiu o Mestrado em Psicologia Clínica e da Saúde na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto.

Referência bibliográfica

Pereira, Raquel, Teixeira, P.M. & Nobre, P. J. (2018). Perspectives of Portuguese People with Physical Disabilities regarding their Sexual Health: A Focus Group Study. Sexuality & Disability, 36(4), 389-406. doi: 10.1007/s11195-018-9538-8 (IF: 0.908; Q2; Indexed in: ISI an Scopus)

Data: 30 de novembro de 2018

Este é o título do artigo científico publicado recentemente na revista Sexuality & Disability (Pereira, Teixeira, & Nobre, 2018) onde estão reportados dados recentes sobre a saúde sexual de pessoas com incapacidades físicas. O estudo, conduzido em Portugal, foi desenvolvido com o objetivo de conhecer e compreender as opiniões, atitudes, e crenças de pessoas com incapacidade física sobre as suas necessidades sexuais e as questões que afetam a sua saúde sexual. Trata-se de um primeiro estudo exploratório do meu projeto de doutoramento acerca da saúde sexual de pessoas com incapacidade física, que se encontra a ser desenvolvido até setembro de 2019.

Este estudo, que se regeu por uma metodologia qualitativa, com recurso a Grupos Focais, contou com a participação voluntária de 26 pessoas com incapacidade física (17 homens e 9 mulheres). Os participantes (com idades entre os 18 e os 51 anos) tinham condições de saúde diversificadas (e.g. lesão vertebro-medular, esclerose múltipla, amputação, etc.), uma vez que não nos interessava particularmente os aspetos específicos de uma determinada patologia, mas sim os aspetos biopsicossociais comuns a todas estas condições incapacitantes e estigmatizantes, nomeadamente no que diz respeito à sexualidade. Assim, após a realização de 4 grupos focais, foi atingida a saturação teórica e procedeu-se à análise final dos dados, através de análise de conteúdo. No artigo, poderão ser encontrados excertos das entrevistas aos participantes, mas, de um modo geral, os resultados agruparam-se em 3 categorias: (a) significados e crenças sobre a sexualidade; (b) experiências de sexualidade; (c) mudanças necessárias.

Antes de mais, estas entrevistas de grupo ajudam à afirmação das pessoas com incapacidade física em relação à sua sexualidade e intimidade, tidos direitos fundamentais a uma vida independente. No entanto, a partilha de experiências revelou um conjunto de fatores (e.g. a baixa autoestima, o isolamento, dependência e falta de privacidade, a falta de acessibilidades e de apoio económico) que limitam a vivência plena da sexualidade destas pessoas. Deste modo, os participantes deixaram algumas sugestões para melhorar os cuidados e serviços disponibilizados no âmbito da sua saúde sexual. Destacam-se o maior acesso a informação especializada sobre o impacto da sua condição de saúde na resposta sexual, bem como a necessidade de formação dos profissionais de saúde nesta área. Os dados encontrados neste estudo são, em boa parte, bastante semelhantes a outros encontrados em estudos anteriores. Porém, estes também refletem particularidades sociais e históricas do contexto português, que levam ao adiamento das discussões públicas sobre o tema sexualidade e incapacitação até mais recentemente, e sob uma prevalente perspetiva heteronormativa.

Apesar das suas limitações, que poderão comprometer a generalização dos resultados, este estudo contribui para chamar a atenção de profissionais e investigadores para esta problemática, dando voz às próprias pessoas com incapacidade física. Assim, pretendemos que esta investigação possa fomentar o conhecimento científico sobre a saúde sexual das pessoas incapacitadas fisicamente, nomeadamente no que diz respeito aos mecanismos psicossexuais que protegem ou vulnerabilizam ao desenvolvimento de dificuldades sexuais, avançando com implicações para a prática clínica. Atualmente, e tendo por base este estudo, já se encontram em preparação dois novos artigos, com dados recolhidos através de questionários a pessoas com e sem incapacidades físicas. Estes novos estudos pretendem ajudar a responder ao objetivo central do projeto de analisar a influência de diferentes fatores cognitivos e afetivos, como as crenças sexuais ou a capacidade para se ser mindful, na saúde sexual das pessoas, muito para além do impacto de uma condição física incapacitante. Todas as novidades poderão ser acompanhadas na nossa página “Sexualidade e Incapacitação”.